Talvez escrever seja também a tentativa de construção de paredes, de volumes do nosso ser...de limites além do corpo, limites na palavra, e para além dela, que é sem limite...
"É por isso que ela quer tão desesperadamente ter em casa esse embrulho de diários e cartas.
Evidentemente, sabe que existe também nos diários uma porção de coisas desagradáveis, dias de insatisfação, de brigas e até mesmo de tédio, mas não se trata disso absolutamente. Ela não quer devolver ao passado sua poesia. Quer lhe devolver seu corpo perdido. O que a impele não é um desejo de beleza.É um desejo de vida.
Pois Tamina está à deriva numa jangada e olha para trás, somente para trás. O volume do seu ser não é senão aquilo que ela vê lá longe, atrás dela. Assim como seu passado se contrai, se desfaz, se dissolve, Tamina encolhe e perde seus contornos.
Ela quer ter esses diários para que a frágil estrutura dos acontecimentos, tal como a construiu em seu diário, possa receber paredes e tornar-se a casa onde ela poderá morar. Porque,se o edifício vacilante das lembranças cai como uma tenda mal levantada, não vai sobrar nada de Tamina a não ser o presente, esse ponto invisível, esse nada que avança lentamente em direção à morte."
O livro do riso e do esquecimento- Milan Kundera
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