sábado, 11 de junho de 2011

E outro fragmento da mesma crônica de Clarice Lispector "Persona"

"Mesmo sem ser atriz nem ter pertencido ao teatro grego- uso uma máscara Aquela mesma que nos partos de adolescência se escolhe para não se ficar desnudo para o resto da luta. Não, não é que se faça mal em deixar o próprio rosto exposto à sensibilidade. Mas é que esse rosto que estava nu poderia, ao ferir-se, fechar-se sozinho em súbita máscara involuntária e terrrível. É, pois, menos perigoso escolher sozinho seu uma pessoa. Escolher a própria máscara é o primeiro gesto volntário humano. E solitário. Mas quando enfim se afivela a máscara daquilo que se escolheu para representar-se e representar o mundo, o corpo ganha uma nova firmeza, a cabeça ergue-se altiva como a de quem superou um obstáculo. A pessoa é.
É que depois de anos de verdadeiro sucesso com a máscara, de repente- ah, menos que de repente, por causa de um olhar passageiro ou uma palavra ouvida- de repente a máscara de guerra de vida cresta-se toda no rosto como lama seca, e os pedaços irregulares caem com um ruído oco no chão. Eis o rosto agora nu, maduro, sensível quando já não era mais para ser."
"Sei que a mudez, se não diz nada, pelo menos não mente, enquanto as palavras dizem o que não querem dizer."

Clarice Lispector
Na crônica Persona in Clarice na cabeceira